quinta-feira, 22 de maio de 2014

A puta !

Fazia um espaço de tempo relativamente elástico que não via e não falava com Maria Gládis. Desde os primeiros tempos de Água ,quando existia um grupo que se reunia invariavelmente as quintas feiras para se encontrar e jogar conversa fora.Nessas ocasiões sempre acontecia de vir à tona assuntos de ordem pessoal de algum dos participantes,buscando muitas vezes ajuda para encaminhar uma solução ou até o simples relato de algum fato ocorrido com alguém presente ou conhecido.Maria Gládis era,talvez,aquela que apresentava maiores peculiaridades,pois além de bonita e atreente ,usava sempre saias curtas ou jeans extremamente colantes.Dizia ela e não admitia ponderações que gostava de mostrar as pernas e não se importava que todo mundo a olhasse,pois considerava que eram suas pernas os elementos mais bonitos que possuía e o que é bonito tem de ser exposto,mostrado.Vários,senão todos tentaram algum tipo de aproximação com ela,algo mais voltado para um relacionamento emocional e a todos ela soube contornar e se manter dentro daquele espirito de camaradagem ,mesmo que nesse espirito houvesse todo o tipo  de liberdades de tratamento e de discussão de assuntos.Nosso grupo era heterogêneo e diversificado,com variações de formação que permitiu com o passar do tempo que todos se conhecessem,independente de estarem sempre presentes ou não.Mas Maria Gládis tinha uma peculiariedade que a distinguia de todos e isso a diferenciava.Suas perspectivas imediatas diziam respeito a trabalhar e ganhar o suficiente para viver bem e viajar bastante,conhecer outras culturas e outros mundos conforme dizia.Mas o que realmente a diferenciava e fazia dela quase uma incógnita era seu sonho maior,coisa que ela defendia veementemente e com convicção:o grande foco de Maria Gládis era ser puta,assim mesmo com todas as letras,coisa que algum tempo atrás era quase um escândalo.Em suas defesas sempre que provocada e estimulada a falar ela afirmava que a liberdade maior não era o direito de ir e vir ,mas sim o livre arbítrio do uso de seu corpo.Ela achava que tinha o direito de fazer sexo e de se relacionar intimamente com quem lhe aprouvesse e que lhe despertasse essa vontade,lógico que com aquiescência do parceiro.Agindo assim ,vão me chamar de puta,então puta é o que quero ser.Um dia Maria Gládis não apareceu,e no outro die e no outro e mais em todos ninguém mais soube dela,sumiu.Como no grupo ninguém sabia dos outros, quase  não era permitido intromissões pessoais na vida de cada um,também não havia como tentar contatá-la para saber o que estava acontecendo.Aos poucos ela foi deixando de ser citada e de ser lembrada  e inclusive o grupo foi se desmantelando até acabar de vez. Por isso tudo me surpreendi, quando almoçava em um shopping e, de repente, ela apareceu e sentou junto a mim.Após os abraços e beijos carinhosos e saudosos ela disse que de súbito,como dizem os paisanos,conheceu um cara,se apaixonou num dia e casou um mês depois.Tem duas filhas e é feliz.Ela mora em Buenos Aires e antes de levantar,faceira e debochada perguntou se eu não ia perguntar mais nada.Eu disse,e teu sonho maior?Ela respondeu que  ele continuava vivo e que viveria para sempre com ela,fosse realizado ou ficasse sempre um sonho.E rindo,feliz,deu um beijo e se foi. 

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